(mordidas mansas)














(por vezes bravas)



morder
 
os legumes
e o cacau,
à beira-mar,
em dias
e dias
de enganos;
afundando
ao vento
cogumelos
duns e doutros;
sem nada
de nada
ao colo
e recortando
fotos
de cães.

sacudindo
dias
de conversas
no camarote.

comendo
causas,
políticas
e erros
de um lado
e do outro;
fixando
de repente
o que tem
a praia:
letras
e girafas.



morder
o mundo

 
todos os minutos
todas as horas
todas as semanas
em francês
e em inglês



morder
os sons

 
em 5 minutos
debaixo de água
conhecendo
lendo
sentindo
e comprando



morder
as imagens

 
pessoais
amadoras
profissionais
em movimento
brevemente
aqui



morder
as palavras

 
sentidas
no escuro
em busca
de tempo



morder
o passado

 
<< hoje



e-mail

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sexta-feira, fevereiro 27, 2004



Porte de La Chapelle, terminus. Tous les passagers sont invités à descendre. La sortie s'effectuera du coté gauche. Je vous souhaite une bonne journée.

Jorge Moniz às 16:23 |



Conclusão

Since I lost the power to pretend
That there could ever be a happy ending
That song is sung out
This bell is rung out


Costello/Bacharach

...mas ainda não sei o depois.

Jorge Moniz às 16:19 |




a inutilidade de um ódio acaba sempre por se sobrepor ao carrasco

Agustina Bessa Luís

Jorge Moniz às 13:03 |



Rua!
É falta de educação ler os blogues dos outros.

Jorge Moniz às 10:00 |



quinta-feira, fevereiro 26, 2004


Saem então trivialidades
Hoje deve ser um dia bom para não estar em Portugal. Quer dizer, para não estar perto de uma televisão onde possa ver a cara do Mourinho.

Esta história das carnes está engraçada. A União Europeia e o Canadá suspendem as importações de aves dos Estados Unidos por andarem lá com vários casos da tal gripe. Precisamente no dia a seguir, os Estados Unidos descobrem que o foie gras e a charcutaria que importam de França são perigosos e suspendem a sua entrada. Depois as autoridades sanitárias francesas sacam da estatística que mostra que na Europa há uma incidência 100 vezes menor de toxicações intoxicações alimentares do que nos Estados Unidos. E um perito acrescenta: "Les Américains bloquent le foie gras pour ce qui nous semble un détail insignifiant. En sens inverse, quand nos vétérinaires visitent leurs abattoirs, ils tombent quasiment en syncope."
Isto a política internacional é muito engraçada.

E agora parece que os serviços secretos britânicos andaram a fazer escutas ao Kofi Annan?!

Jorge Moniz às 15:20 |




O que é que eu hei-de dizer mais?

Jorge Moniz às 15:05 |



Be my thief

I didn't lead you on,
But there will always be
A little larceny in everyone

So hush and don't you cry
I'm trying to be kind
Because I have a perfect alibi


Costello/Bacharach

Jorge Moniz às 12:36 |



Remember Sammy Jenkins?
Este filme usa um truque semelhante a este. Mas enquanto neste isso faz sentido com a história que é contada, neste parece-me apenas figura de estilo que tanto podia ser usada nesta como noutra história.

Jorge Moniz às 09:55 |




Com o frio que está e a minha mania de não usar esses cremes metro-beckham-whatever, até já tenho pintas de sangue nas nozes dos dedos...

Jorge Moniz às 09:55 |



quarta-feira, fevereiro 25, 2004


Será mesmo?
Há quem diga que cada um tem o que merece.

(veio-me à ideia entre duas passagens pelas brazas brasas)

Jorge Moniz às 15:19 |



Countdown
Esta contagem decrescente tem sido acompanhada de muito pouca inspiração... E as poucas horas dormidas nos últimos dias não ajudam nada.

Jorge Moniz às 15:01 |



Curiosa esta reflexão do JPP
De longe, de outro carnaval, olho com estranheza o carnaval português. Num país machista, em que a cultura masculina dominante é machista, em que os valentões de café, de escritório, de praia, de carro, proliferam, subitamente chega o carnaval e todos eles descem à rua vestidos de mulher, aos magotes, aos milhares, exibindo as mamas falsas e os collants. Há qualquer coisa de estranho em tudo isto.

Jorge Moniz às 14:52 |



Cabarets de Paris: Au Lapin Agile

Cabaret é uma palavra francesa que significava originalmente taverna ou estalagem. Durante o século XIX, tornaram-se populares em vários países da Europa locais onde havia comida, bebida e entretenimento. Nasciam os cabarets artistiques, em que jovens artistas mostravam o seu trabalho a pessoas sentadas à mesa e não numa plateia. Podia-se assistir a música, poesia, humor, dança, etc. Nalguns casos até hoje.
É o caso deste cabaret situado na encosta norte de Montmartre, onde se cruzavam escritores, poetas, músicos, actores, pintores, escultores, na altura desconhecidos, mas que depois se vieram a chamar Picasso, Utrillo, Braque, Modigliani, Guillaume Apollinaire, Max Jacob, Roland Dorgelès, Caran d’Ache, etc. Frédé tocava guitarra e violoncelo e cada um cantava, tocava ou recitava obras de sua autoria ou canções populares.
No início chamava-se Cabaret des Assassins, até que um dia o caricaturista André Gill pintou na fachada um letreiro com um coelho saltando dum tacho, "Le lapin à Gill", que foi subvertido em "Lapin Agile".
Hoje em dia o público é maioritariamente constituído por turistas, que assistem e participam num espectáculo de "canção, humor e poesia".
A história mais extraordinária que ali aconteceu tem por protagonista alguém chamado Boronali. Este pintor fictício apresentou no Salão dos Independentes uma tela abstracta chamada "Pôr-de-Sol no Adriático", obtendo sucesso junto dos críticos de arte. Até que se veio a saber que tinha sido feita em frente do Lapin Agile, pelo burro de Frédé, a cujo rabo eles tinham atado um pincel.




Jorge Moniz às 11:58 |



Sennelier
Eu queria saber o nome e a morada daquela loja de cores de que falei na sexta-feira, mas estava complicado. Vi imagens na televisão mas não fixei nomes e na internet não consegui encontrar nada. Até que me chegam cá os hóspedes R&R, precisamente com uma encomenda para os pastéis de óleo inventados nessa loja a pedido de Picasso.
Fica então na rue de la Grande Chaumière (onde está também a Academia do mesmo nome em que o Amedeu estudou e conheceu a Jeanne) e tem uma página que conta a história toda no link ali do título.

Jorge Moniz às 10:05 |



terça-feira, fevereiro 24, 2004


Piada de Carnaval:

Sinais exteriores de riqueza: Estado identifica mais de 200 contribuintes em situação irregular

200???? Esqueceram-se de quantos zeros?

Jorge Moniz às 13:20 |



Boneco:
É para ti que eu escrevo hoje. Sabes, é que é feriado em Portugal, mas aqui não. Bom, eu sei que não é bem feriado, é tolerância de ponto, ou lá como é que se chama. Mas o que eu quero dizer é que ninguém está a trabalhar por lá, por isso escrevo quase só para ti, pronto. Sim, de facto parece paradoxal, mas as pessoas lêem estas coisas é durante a semana, nos seus locais de trabalho e não nos tempos livres. Nos tempos livres fazem coisas mais interessantes do que andar na internet a fingir que estão a trabalhar. Como eu. Quer dizer, agora já não, porque esta é a minha última semana aqui e já está quase tudo tratado.
E tu boneco? O que tens feito? Só ouves, não é? Na qualidade de boneco não podes falar, não podes responder aos disparates que as pessoas te dizem, por isso ouves apenas. É essa a função do boneco: ouvir. Ou ler, neste caso. Tu sabes ler, boneco? É que nunca te vi os olhos a mexer e se não sabes ler, estou para aqui a perder o meu tempo. Olha vou ali arranjar um sintetizador de voz para poderes ouvir o que eu escrevo, tá bem? Volto já.

Jorge Moniz às 12:05 |



segunda-feira, fevereiro 23, 2004


///\\\
A esperança é a última a morrer porque é ela que nos vai matando a nós.

Jorge Moniz às 15:56 |



Onde é que estavas no...?
No 25 de Abril não sei bem o que fiz, mas imagino que tenha dado uns pontapés à minha mãe para saltar cá para fora. Só o consegui 10 dias depois.
Por outro lado, lembro-me do dia de hoje há 17 anos. Eu estava na escola, andava no 8° ano e foi também uma segunda-feira. Não sei porquê, mas nesse dia os meus pais foram-me buscar e foi no banco de trás do carro, enquanto metíamos gasolina, que ouvi as notícias na rádio.

Que amor não me engana
Com a sua brandura
Se da antiga chama
Mal vive a amargura

Duma mancha negra
Duma pedra fria
Que amor não se entrega
Na noite vazia?

E as vozes embarcam
Num silêncio aflito
Quanto mais se apartam
Mais se ouve o seu grito

Muito à flor das àguas
Noite marinheira
Vem devagarinho
Para a minha beira

Em novas coutadas
Junto de uma hera
Nascem flores vermelhas
Pela Primavera

Assim tu souberas
Irmã cotovia
Dizer-me se esperas
Pelo nascer do dia


José Afonso

Jorge Moniz às 14:09 |



Copiado na íntegra, este post da Sara

(deixem o cursor em cima do texto para ser mais fácil de ler)

Algumas formas de submissão culturalmente aceites:

- A grande maioria das mulheres quando se casam adoptam o nome do marido;
- A mulher, em geral, dentro do núcleo familiar, tem sempre o carro mais pequeno ou o que foi mais barato;
- Depois de uma almoço ou jantar, em geral, são as mulheres que levantam a mesa e arrumam a cozinha;
- Em muitas monarquias o filho varão herda o trono - lei sálica - ainda que seja o mais novo;
- A mulher é, muitas vezes, vítima de violência doméstica [Se acontece com a frequência que todos sabemos ela deve ser culturalmente aceite ou não?!... Será?];
- A mulher recebe um salário inferior ao homem em muitos casos ainda que desempenhem a mesma função;
- A mulher tem pelo menos uma parte do seu corpo submissa à legislação portuguesa;

Algumas formas de submissão culturalmente não aceites:

- Uso de hijab ou burka;
- A mulher não trabalha e não estuda. Compete-lhe ficar em casa e cuidar dos filhos e do marido;
- A mulher não tem direito de voto;
- Uma mulher infértil não vale nada;
- A mulher apanhada em adultério é apedrejada até à morte;
- A mulher não pode sair do país sem autorização do marido;

A cultura tem um forte peso entre as condutas aceites e não aceites... Mas se recuarmos 40 anos atrás no nosso país podemos ir à lista do não culturamente aceite e passá-la quase toda para o aceite.


Será preciso esperar mais outros 40 anos para a lista de cima passar para a de baixo?

Jorge Moniz às 10:21 |



%
Numa sondagem, 40 % das mulheres francesas disseram não acreditar que exista um homem que as possa satisfazer completamente a nível sexual.
Não sei se hei-de reflectir mais sobre as mulheres francesas, ou sobre os homens franceses...

Como prova de que a estatística pode dizer coisas ainda mais estranhas, um estudo norte-americano diz que as mulheres solteiras com mais de 30 anos têm uma maior probabilidade de morrer num atentado do que de casarem.
Caso alguém ainda hesitasse em dar algum crédito a este dado, acrescentaram um pequeno detalhe: o estudo foi feito antes do 11 de Setembro.

A propósito, acabo de descobrir que no meu seguro de habitação anual estão incluídos 3,3 euros para cobrir o risco de atentado.
Eu gostava de conhecer as fórmulas que nas seguradoras usam para transformar um risco subjectivo em euros objectivos. Deve ter a sua piada... Num apartamento perto da Torre Eiffel ou da Torre Montparnasse o risco será mais do que 3,3 euros? E fora de Paris será quanto? Será mais caro o seguro para um 17° andar do que para um 2°?

Jorge Moniz às 09:55 |



sexta-feira, fevereiro 20, 2004


EU SOU PORTUGUÊS
Foram divulgadas as estatísticas do último recenseamento da população de França. É uma população em crescimento, mais devido aos nascimentos do que à imigração, o que é contrário à tendência normal na Europa. Além das razões culturais, há também os fortes apoios às famílias numerosas (a partir de 3 filhos quase não se paga IRS) e a facilidade na educação das crianças (há uma escola ou uma creche em cada esquina).

Mas não era disto que eu ia falar. A propósito do recenseamento, voltou-se aos 16 000 idosos mortos no verão passado por causa do calor. Por aqui ainda se debatem as causas e os possíveis remédios.
Quanto às primeiras, tem grande destaque a falta de interesse das famílias, que estavam na praia sem se preocuparem com os seus idosos sozinhos em casa, e alguma falta de apoio institucional em termos de lares e do seu elevado custo.
Quanto aos remédios, nos telejornais franceses é muito frequente fazerem-se comparações com as soluções usadas pelos colegas europeus, quase sempre os vizinhos: Alemanha, Itália, Espanha, Reino Unido. Mas hoje no telejornal da TF1 mostraram como se fazem as coisas em Portugal.
Reportagem do correspondente: uma carrinha apanha várias senhoras idosas nas suas casas, o motorista já as conhece pelos nomes e leva-as ao Centro de Dia do Campo Grande. Mostram imagens de uma representação teatral em que alguns dos utentes participam enquanto os outros assistem. A directora fala francês e esclarece que recebem lá 200 pessoas que pagam 7 euros por mês, o resto sendo coberto pela Segurança Social. Dali a pouco começa um bailarico. Uma das senhoras faz uma pausa na dança e diz para a câmara que se sente ali muito feliz.

Da próxima vez que disserem que Portugal está na cauda da Europa nisto e naquilo, lembrem-se desta história. A nossa mania do coitadinho impede-nos de ver tudo.

Mas logo tinha de ser numa 6ª feira?
É que amanhã não posso chegar ao trabalho e dizer aos meus colegas: Eu sou português.

Jorge Moniz às 19:55 |



Bairros de Paris: Montparnasse
Antes dos imigrantes portugueses, os homens que em Paris trabalhavam na construção e as mulheres na limpeza vinham da província, sobretudo da Bretanha. Na segunda metade do século XIX, o comboio que os trazia deixava-os na Gare de l'Ouest, em pleno bairro de Montparnasse. A afluência foi crescendo e uma nova gare, já chamada de Montparnasse, teve de ser construída no mesmo local.
A 22 de Outubro de 1895, um maquinista zeloso conduzia um comboio que tinha partido com algum atraso. Para recuperar tempo entrou demasiado rápido na gare e não conseguiu parar antes do fim da linha. A locomotiva despenhou-se de uma altura de 10 m sobre uma paragem de eléctricos. Alguns anos mais tarde foi então construída a terceira, e actual, gare, umas dezenas de metros mais a sul. Na localização original está hoje o conhecido pedaço vertical de Manhattan que se vê de toda a cidade.
Os bretões que chegavam, instalavam-se nas redondezas da gare e a partir de 1935 foram-se abrindo por ali cafés e restaurantes onde se bebia a cidra, se comiam os crepes e depois se arredavam as mesas para se tocar e dançar música celta. Ainda hoje isso acontece em alguns locais e as crêperies em Montparnasse encontram-se em cada porta. Ainda hoje, num pátio escondido, os que têm saudades da sua terra reúnem-se e lêem contos da mitologia celta ao som da harpa.

Montparnasse é também bairro de pintores. No final da Exposição Universal de 1900, a estrutura metálica do pavilhão dos vinhos de Bordéus, desenhada por Eiffel, foi aproveitada para a construção de um conjunto de 140 ateliers em alvéolos. Chamava-se e chama-se La Ruche (a colmeia) e sucedeu ao Bateau-Lavoir de Montmartre. Enquanto por este passaram Gauguin, Picasso, Braque, Modigliani, La Ruche acolheu Soutine, Chagall, Léger, de novo Modigliani e muitos outros artistas vindos de todo o mundo, que ainda hoje lá trabalham e vivem.
Todos estes pintores precisam naturalmente de matéria-prima: tintas, óleos, pastéis, cores. A mais antiga loja de cores (só este nome é fabuloso) de Montparnasse tem atrás do balcão a bisneta do seu fundador e mantém todas as estantes, armários, prateleiras e gavetas nos mesmos lugares. Nas paredes estão pinceladas amostras de cores criadas por encomenda nas traseiras da loja. Picasso trouxe para ali um novo tipo de pastel, mais gordo do que o habitual, e ao abrir as gavetas encontram-se milhares de cores, formas e texturas diferentes.
Era hábito os pintores pagarem as compras com os seus próprios quadros, também uma forma irónica de a cor voltar ao local onde nasceu. O meu amigo Amedeu, esse, tinha fama de mau pagador.

Jorge Moniz às 16:04 |



Vão-se ver gregos
Os Jogos Olímpicos começam bem! Só num exercício de simulação já conseguiram dois feridos graves!

Jorge Moniz às 14:53 |




Eu disse ali em baixo que já tinha mais tempo, não é? Menti. É que no meio de mais um formulário, em letras pequenas, estavam as instruções secretas para mais um relatório!

Jorge Moniz às 14:18 |



Post patriótico
Agora que o trabalho já quase acabou, nestes dias que me restam vou dedicar-me à nobre tarefa de aproximar a produtividade portuguesa da média europeia.
Claro que, estando eu em França, o único modo de o fazer é baixar a média europeia. Ah, pois...

(nota mental: ganhar juízo e voltar a posts mais sérios)

Jorge Moniz às 09:50 |



A ver se arranjo umas vulgaridades para dizer...
Quando em Agosto os parisienses estavam todos na Côte d'Azur, sempre havia os turistas a compôr o cenário. Agora que os parisienses estão todos nos Alpes, está fresquito demais para andarem aí turistas a passear.

Aliás, falando de fresquito, não são os 3 ° C lá fora que me incomodam quando ando na rua. O que me faz piscar os olhos, encolher-me, ficar com a pele toda estalada é o vento! Passou a noite toda a assobiar-me pelas chaminés abaixo!

Ao que eu lhe respondi: brló-pó-pó brló-pó-pó brló-pó-pó

(não voltas a beber Bacardis antes da hora de almoço!)

Jorge Moniz às 09:09 |



Agora já tenho tempo
mas tenho pouco para dizer...
Ou, como diz um amigo meu depois de alguns Bacardis lemon com sumo de maçã:
brló-pó-pó brló-pó-pó brló-pó-pó

Jorge Moniz às 09:00 |



quinta-feira, fevereiro 19, 2004


Ato de contrissão
Comessou Começou e uma móda moda, de não apagar os erros cumetidos cometidos ao escrever posts, mas antes riscalos riscá-los e deichálos deixá-los visíveis para penitência púbica pública.

Jorge Moniz às 16:31 |




bom, agora que já só chegam ao pescoço...
sai posta

Jorge Moniz às 16:30 |




ora esperem la' um bocadinho que estou cheio de burocracias de départ até às orelhas!

Jorge Moniz às 09:53 |



quarta-feira, fevereiro 18, 2004



Acabei neste preciso momento os meus dois relatórios: um em francês e outro em inglês.
Estou pasmado: apesar de andar há vários anos a ler e escrever em inglês, acho que agora já escrevo melhor em francês...

Jorge Moniz às 17:04 |



Há quanto tempo eu não...

Eu só queria dançar contigo
Sem corpo visível.
Dançar como amigo
Se fosse possível.
Dois pares de sapatos
Levantando pó
Dançar como amigo só.


Sérgio Godinho

...pois já foi há uns dois anos e meio que deixei a salsa...

Jorge Moniz às 15:07 |



Pronto cá vai a versão integral (eu avisei que era grande...)

Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso eu do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que ideia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

«Constituição íntima das cousas»...
«Sentido íntimo do Universo»...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores

Um vago ouro lustroso vai perdendo escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.


Alberto Caeiro

Jorge Moniz às 13:19 |



2004
Um mais envelhecido do que velho homem aproximou-se. Esquálido e calvo, cambaleava dentro de umas negras e largas calças e de um negro e largo casaco. Mal abrindo a minúscula boca de lábios finos onde tentava esconder uma dentição desordenada e apodrecida, disse numa voz mínima e tímida:
- Sabe minha menina, há pressentimentos de ano novo que acertam em cheio. Mesmo sem a gente estar à espera da mudança. E agora o que é que eu faço? Passo a ler a página da astrologia?

Jorge Moniz às 10:05 |




Nunca tinha reparado que as palavras fantasma e fantasia eram tão parecidas...

Jorge Moniz às 10:01 |



Estão de volta as greves ridículas
O aeroporto de Orly fica a alguns km a sul de Paris. O aeroporto de Roissy fica a alguns km a nordeste de Paris. Para uma melhor gestão do espaço aéreo da zona, planeou-se passar os controladores aéreos existentes nos dois aeroportos para um único centro, em Roissy. Sem qualquer diminuição de postos de trabalho. Ora os controladores de Orly estão em greve porque não querem mudar do sul de Paris para o norte de Paris, entre outras razões por causa das escolas dos miúdos! Haja paciência (e a minha já fugiu a sete pés há algum tempo)! Não é ir de Paris para a province! É apenas dum subúrbio para outro. É como se uma empresa mudasse de Almada para Alverca. Vejam se ganham juízo que eu vou de regresso com a TAP, ou seja a partir de Orly, e já tenho chatices que cheguem.

Jorge Moniz às 08:53 |



Há também...
...a variante de palavras aleatórias, como fez a Catarina (esta firewall não me deixa comentar nos weblogs.pt por isso fica dito aqui). O que ela não imaginava era que lá no meio aparece um dos meus nomes de família!
(é "nome de família" que se diz em Portugal? ou é "apelido"? ai se a minha família de docentes me vê nestas dúvidas!)

Jorge Moniz às 08:50 |



terça-feira, fevereiro 17, 2004


Pronto, é isto que me apetece escrever
lkqjerltnuczhcelgherfvhndshncqmzleruzec zifizncraz izlehrcn zfkjlsdfh kjs hkjlqzehv nqe dhvqshfkjc qzuifqhzliehruiz cjzh ekrhizuc fhqzieufhc qzfhiuqlzerhf ziuzhfiluzehfcl iqzhiufhliutgvnlqzi lbfgiuzyvblqizu fheuifghli nchaqiu fhqziuelch n"liu nzhfuihziurhv ziluv heijbvklserghm ezorivnzfbizqevfhau"chizue fhqiuzeqtv a"e nghiuqzlehc nfauio"h trvqiezufcn hfiauzvhf qziuefhizeuovt anh"oivuf hqlzieurfha"iuvth alizeufhvuizetvhb aileurfvh zlqfiuzav brhazielufhizudfh leifh bcfaziue lrzn oiqe voiqeutrvp,ozeivu oqizeurcvoizequ voiezutrv qeion uioeqrutv,zeoivu tqeriotu,v peoritu nqopierutoiv," piutioeruvt poierut vzenpoitupeartviout,vpozieutcn poieuteno topieru vtopirezutnzeoirtnuvpaeriotueoinf,pdio,fcpiozeuvtdrrtt

Se há pintura abstracta por que razão não há-de haver escrita abstracta? Se a ideia é ir procurar as motivações do autor tanto dá num caso como noutro. Ou se a ideia é antes descobrir as técnicas utilizadas, talvez dê para perceber onde é que usei dedos e onde é que usei punhos.

Jorge Moniz às 15:28 |




Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso eu do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

(...)

Alberto Caeiro

(Ia meter o poema inteiro que até é jeitoso, mas não me apetece. Além de que é enorme e ninguém o ia ler.)

Jorge Moniz às 14:46 |



Cuidado
Isto hoje vai tudo à frente!

Apetece-me... sei lá o que me apetece!

Jorge Moniz às 12:34 |



Portugal na televisão
Foi hoje de manhã nas notícias.
Vi Aveiro, onde umas mulheres com ar de porteiras parisienses se manifestavam.
Vi Lisboa, onde uns rapazes com pele rabinho-de-bebé davam uns autocolantes às pessoas numa paragem de autocarro.
Vi um mapa da Europa onde todos os países estavam pintados de verde, menos três que estavam pintados de vermelho. Estes eram Portugal, Malta e Irlanda. Malta é tão pequeno que mal se via a pinta vermelha. Mas a Irlanda fez-me lembrar um filme, "The Magdalen Sisters". É com isto que somos comparáveis...?
À cautela hoje volto a fechar-me no gabinete, não vão estes bárbaros europeus descobir...

Jorge Moniz às 09:32 |



segunda-feira, fevereiro 16, 2004


chuif

Ao almoço um colega meu estava com uns dvd's para levar para os miúdos. Resultado: fiquei a tarde toda com esta música na cabeça!

Lá em cima há planícies sem fim
Há estrelas que parecem correr
Há o Sol e o dia a nascer
E nós aqui sem parar numa Terra a girar

Lá em cima há um céu de cetim
Há cometas, há planetas sem fim
Galileu teve um sonho assim
Há uma nave no espaço a subir passo a passo

Lá em cima pode ser o futuro
Alegria, vamos saltar o Mundo
E a rir, unidos num abraço
Vamos contar uma história
Era uma vez o Espaço

Lá em cima já não há sentinelas
Sinfonia toda feita em estrelas
Uma casa sem portas nem janelas
É estender um braço e tu estás no Espaço!


É impressão minha ou isto era cantado pelo Paulo de Carvalho? E terá sido ele a fazer a adaptação da letra? Reparo agora que não está nada mal...
Se quiserem ouvir podem sacar daqui.
E já agora a versão original era assim:

L'infini, des prairies bleues du ciel
Découvert, comme un grand livre ouvert
Et la Terre, cette bille éphémère
Qui prend, quand l'étoile passe
Sa vraie place dans l'espace

Infini, qui devant nous dévoile
Ses comètes, ses planètes, ses étoiles
Et le ciel, tel un rêve éternel
Où le temps même s'efface
Pour faire place à l'espace

Infini, vers lequel nous allons
Plein de joie, sur les chevaux du vent
Le futur, l'aventure nous font fâce
Laisse moi, te conter, il était une fois... l'espace

Infini, dont nous sommes sentinelles
Symphonie, à portée de nos ailes
Harmonie, dont jamais on ne se lasse
Tu verras, viens prends place, nous partons pour l'espace


E já que as músicas são como as cerejas, lembrei-me a seguir desta outra:

Enfant du soleil
Tu parcours la Terre le ciel
Cherche ton chemin
C'est ta vie, c'est ton destin
Et le jour, la nuit
Avec tes deux meilleurs amis
A bord du Grand Condor
Tu recherches les Cités d'Or

Aaaah ah ah ah ah
Esteban, Zia, Tao les Cités d'Or


Para brevemente: Bell e Sebastião, o ursinho Misha, Calimero, Ulisses 31 (descobri ontem que este ainda dá cá na televisão!)..........

Jorge Moniz às 15:03 |



sexta-feira, fevereiro 13, 2004



Cláudio II, Imperador Romano, estava com dificuldades em angariar soldados para combater nas regiões mais longínquas do Império. Acreditando que o que os retinha eram as suas esposas, decidiu proibir os casamentos em período de guerra. Houve, no entanto, um padre que se rebelou e continuou a celebrar casamentos em segredo. Descoberto, foi preso, torturado e decapitado.

Jorge Moniz às 14:05 |



Afinal digo
James Dean morreu num acidente de viação porque, quando percebeu que estava em rota de colisão com o outro carro, o instinto lhe disse para acelerar em vez de travar.
Quando este percebeu que a luz ao fundo do túnel afinal era o comboio, teve também que decidir rapidamente por onde havia mais hipóteses de se salvar: continuando para a frente ou voltando para trás. Ora isso depende sempre do local do túnel onde já se chegou, mas também da velocidade do comboio.
(e há sempre a hipótese de se enganar de propósito nas contas)

Jorge Moniz às 11:01 |



Olha Luís, aqui vai um pedaço de Seinfeld!
Até hoje pensava que a pior frase que podia ouvir de uma rapariga era "Temos que falar...". Mas não! A pior frase de todas é: "Eu também gosto de ti... mas como amigo." Isto significa que para ela tu és o mais simpático do mundo, aquele que melhor a compreende, o mais dedicado... mas nunca vai sair contigo.
Vai sair com um gajo nojento que apenas quer ir para a cama com ela.
Aí sim, quando o outro lhe faça alguma das dele, ela chamar-te-á para pedir-te conselhos. É como se fosses a uma entrevista de trabalho e te dissessem:
"Você é a pessoa ideal para o posto, tem o melhor currículo, é o que está melhor preparado... mas não vamos contratá-lo. Vamos contratar um incompetente. Só lhe pedimos uma coisa, quando esse gajo fizer asneira, podemos chamá-lo para tirar-nos da embrulhada em que ele nos meteu?"
Eu pergunto: o que é que fiz mal? Fomos ao cinema, rimo-nos, passámos horas em cafés... e depois de quantos cafés ficámos amigos de verdade? Depois de cinco? Seis? Com um café menos e tinha ido para a cama com ela!!
Para as mulheres, um amigo rege-se pelas mesmas normas de um Tampax:
podem ir para a piscina com ele; podem montar a cavalo; dançar..., mas, a única coisa que não podem fazer com ele é ter relações sexuais.
Ainda por cima, bem vistas as coisas... se para uma mulher considerar-te "seu amigo" consiste em arruinar a tua vida sexual, o que fará ela com os inimigos? A mim parece-me muito bem que sejamos amigos, o que não percebo é porque é que não podemos "ir para a cama como amigos". Eu penso que a amizade entre homens e mulheres não existe, porque se existisse saber-se-ia.
O que acontece é que quando ela te diz que gosta de ti como amigo, para ela significa isso e ponto. Mas para ti não. Para ti quer dizer que se numa noite estão na praia, ela já com uns copos, está lua cheia, os planetas estão alinhados e um meteorito ameaça a Terra... podias muito bem ir para a cama com ela!!
Por isso engoles... Por isso nunca perdes a esperança. Ela sai com o Joe?
Isso vai acabar. E quando isso acontecer, tu atacas com a técnica de consolador:
"Não chores, o Joe era um chulo. Tu mereces muito melhor, alguém que te compreenda, alguém que esteja no sítio certo quando tu precisas, que seja baixito, que seja moreno, que não seja muito bonito, que se chame John... COMO EU!!"

Pelo menos, sendo amigo podes meter nojo para eliminar concorrência. É a técnica da "lagarta nojenta". Quando ela te diz:
- Que simpático é o Paul, não é?
- O Paul? É muito simpático... só é pena ser um pouco estrábico.
- Ele não é estrábico, o que tem é um olhar muito ternurento.
- Sim, tens razão. No outro dia reparei nisso quando olhava para a Marta.
- Não estava a olhar para a Marta, estava a olhar para mim!
- Vês como é estrábico?

O cúmulo dos cúmulos é o facto dela considerar ter uma relação "super especial" contigo quando pode dormir na mesma cama sem que se passe nada.
COMO É QUE É??!! Então o "super especial" não seria que se passasse algo?!
Um dia depois de uma festa, tu ficas a ajudá-la a limpar, como fazes SEMPRE, e quando acabam ela diz:
- UH! Que tarde. Porque é que não ficas cá a dormir?
- E onde é que durmo?
- Na minha cama.

Aí, até te tremem as pernas. "Esta é a minha noite, alinharam-se os planetas!". Passados uns minutos, dás-te conta que não são precisamente os planetas que se alinharam, porque ela, como são amigos, com toda a confiança fica em roupa interior e tu, pelo que vês, pensas: "Vou ter que ficar de boxers. Com todo o alinhamento de planetas que tenho em cima..."
E, assim que te metes na cama, dobras os joelhos para dissimular. Ela mete-se na cama, dá-te uma palmada no rabo e diz-te "Até amanhã". E põe-se a dormir!
"COMO É QUE É??!! Como é que se pode pôr no ronco tão cedo? E esta fulana não reza nem nada?"
Estás na cama com a rapariga dos teus sonhos. No início nem te atreves a mexer, para não tocar em nada. Sabes que se nesse momento fizessem um concurso, ninguém te podia ganhar: és o gajo mais quente do mundo. E como é longa a noite! Vêm-te à cabeça um monte de perguntas: "Tocar uma mama com o ombro será de mau amigo? E se é a mama que toca em mim?" Mas depois de muitas horas, já só fazes uma pergunta: "SEREI REALMENTE UM MANSO?!" Não podes acreditar que estás na mesma cama e não se vai passar nada.

Confias que, a qualquer altura, ela vai dar a volta e dizer "Anda lorpa, que já sofreste bastante. Possui-me!" Mas não. Para as mulheres parece que nunca sofremos o suficiente. E como sofres... Porque tens todo o sangue do corpo acumulado no mesmo sítio. Já houve mesmo casos de homens que rebentaram.

Mas ainda não acabou a tua humilhação. Às 7 da manhã tocam à campainha:
- AH! É o Joe!
- O Joe? Mas ele não te tinha deixado?
- Depois conto-te tudo. Estou com pressa. Esqueci-me de dizer-te que o Joe ia trazer o cão. Como vamos à praia eu disse-lhe que ficando contigo o cão não podia estar em melhores mãos. Porque tu és um amigo!
UH?! Estás com má cara. Dormiste bem?
E aí ficas tu com o cão, que esse sim é o melhor amigo do homem.

Jorge Moniz às 08:57 |



quinta-feira, fevereiro 12, 2004


shshshshshshshsh
A senhora que ouve estática na rádio só ouve estática na rádio.
Em casa tem uma pequena telefonia que está quase sempre numa frequência sem emissores, cuidadosamente escolhida em função da textura de estática obtida. Cada vez que um dos filhos a visita, diz-lhe "mãe por que é que voltou a mudar isto?", e volta a mudar aquilo para um posto qualquer, de preferência que passe música dos tempos em que ela era nova, nunca se sabe. Mas assim que eles saem ela volta a ouvir a estática na rádio.
Quando anda na rua, ou nos transportes públicos, a senhora que ouve estática na rádio leva um walkman, onde só ouve estática. Por vezes, as pessoas que se sentam ao lado dela no autocarro reparam e fazem um ar surpreso. Ela não repara quando eles reparam. Fecha os olhos e tudo o que vê não é preto - é às pintas pretas e brancas. Depois muda a frequência do rádio, o som da estática muda e as pintas pretas e brancas mudam.
A senhora que ouve estática na rádio lê edições antigas de livros da Agatha Christie, comprados nos alfarrabistas do Quai de la Tournelle.

Jorge Moniz às 15:56 |



Uns anos mais tarde...
...andava eu no secundário, chego de manhã ao pé de um colega que vinha com uma ligadura na mão esquerda e um ar combalido:
- Então pá: que é que te aconteceu?
Ele olhou à volta a ver se havia alguém e respondeu baixinho:
- Não é nada: é ronha pás gajas.

Jorge Moniz às 15:31 |



Uns anos depois...
...de aprender a falar e a andar, lembro-me de ver na televisão umas reposições de um programa de humor do Jerry Lewis gravado ao vivo. Eu não achava muita piada aos sketchs, demasiado à base de humor físico e caretas, mas lá ia vendo aquilo. O que me lembro ainda muito bem é que, no fim de cada programa, ele se chegava à beira do palco e antes de agradecer e se despedir cantava a primeira estrofe duma música feita por Charlie Chaplin para os "Tempos Modernos" (a letra é de John Turner e Geoffrey Parsons). Mais tarde foi gravada pelo Nat King Cole e depois pela filha. Ontem ouvi-a na rádio numa versão do Rod Stewart.

Smile though your heart is aching;
Smile even though it's breaking.
When there are clouds in the sky, you'll get by.
If you smile through your fear and sorrow,
Smile and maybe tomorrow,
You'll see the sun come shining through for you.

Light up your face with gladness,
Hide every trace of sadness.
Although a tear may be ever so near,
That's the time you must keep on trying,
Smile, what's the use of crying?
You'll find that life is still worthwhile,
If you just smile.

Jorge Moniz às 14:59 |



Gugu dada
Normalmente a primeira palavra que os bebés dizem é composta por duas sílabas iguais. Os pais, partes interessadas na educação do rebento, vão-lhe repetindo os sons que ele deve aprender, até um dia sair então o "papá", ou o "mamã", depois o "vovô" e a "vovó", mais a "titi" e por aí fora.
A minha história é um pouco diferente. Os meus pais já estavam a ficar preocupados com a demora em vir a primeira palavra, não sabendo que só depois de dominar bem a teoria é que eu passo à prática. (Foi o que aconteceu também para começar a andar: num belo dia estava sozinho no corredor e corri-o de uma ponta à outra sem ajudas.)
Pois está a minha mãe a encher-me um copo com água do garrafão, enquanto eu estou sentado numa daquelas cadeiras altas com tampo à frente. Depois da operação concluída, ela quer fechar o garrafão e olha à volta pensando "mas onde é que eu meti a..."
- Tampa! - gritou o bebé de braço esticado com o objecto na mão.

Jorge Moniz às 14:27 |



Penso
Os desconhecidos que nos falam nos sonhos são bebés que nascem nesse preciso momento num qualquer lugar do mundo e que quando crescerem vão ter aquela cara, aquela profissão, aquela voz e vão dizer a alguém coisas como as que nos disseram esta noite.

Jorge Moniz às 08:22 |



quarta-feira, fevereiro 11, 2004


Estava aqui a pensar...
...o que estarás a fazer agora?
Não "agora" que o estás a ler, mas "agora" que o estou a pensar.
(O que tanto pode ser há um minuto como há um mês atrás. Ter posts muito tempo em estaleiro dá nisto!)

Jorge Moniz às 12:25 |




Está com piada a citação de hoje aqui ao lado.

Jorge Moniz às 10:04 |



Em arrumações no meu portátil...
...dei de caras com a banda sonora da minha estadia no Brasil.


Jorge Moniz às 09:58 |




Não é quando me pedes opiniões, nem quando deixas reticências no fim de algumas frases para eu completar. Nessas alturas dou umas respostas distantes e altivas. É só quando menos esperas que eu te assalto com um piropo.
(agora tapa os ouvidos para não ouvires esta parte: o truque resulta)

Jorge Moniz às 09:15 |



Etat des lieux
A minha casa é um atlas. Ao verificar a lista de todos os objectos do meu apartamento para a entrega, reparei nisto: faqueiro sírio, armário chinês, narguilé, copo sírio, caixa coreana, gravuras inglesas, almofadas sírias, candeeiro marroquino, cinzeiro indiano, candeeiro japonês. Claro que vários deles passaram este ano escondidos em armários.

Jorge Moniz às 08:04 |



terça-feira, fevereiro 10, 2004


Coisas de que vou ter saudades:
  • crepes, crème brulé, couscous, merguez, chocolatines, flute à l'ancienne;

  • cais do Sena, canal St. Martin, Montmartre, Bercy, St. Germain;

  • 370 estações de metro;

  • 250 filmes à escolha nos cinemas;

  • uma florista em cada esquina, algumas das quais abertas toda a noite (é a chamada loja de conveniência!);

  • ir a pé a todas as lojas de que preciso;

  • o mercado da minha rua, os pregões, os saldos nos legumes à hora de fechar;

  • os cheiros da minha rua: das padarias, da loja dos cafés, da casa dos frangos, dos bolos alemães;

  • o tipo na minha rua a dizer "vous n'auriez pas un centime ou deux pour une baguette de pain?";

  • desconhecidos que em vez de resmungarem "brigad", cantarolam "Merci beaucoup!! Vous êtes três gentil, monsieur!!";

  • os jardins cheios de pessoas a ler livros, a correr, a fazer tai-chi, a brincar com barcos à vela, a andar de pónei, de patins em linha;

  • os meus vidros duplos;

  • "Les guignols de l'info", Nathalie Ianetta no "Merci pour l'info", Veronique Mounier no "Télématin", Thierry Ardisson no "Tout le monde en parle", todos no "Arrêt sur images";

  • as aventuras do Bill na Escócia, os espirros da Martine, o Jean-Loup a falar sozinho, o Olivier a espiar-me em St. Michel, a Céline a rir-se, a Marie France a rir-se, a Marie-Clotilde a rir-se, a maçã vermelha do Roland todos os dias ao almoço, as mesuras do Bertrand, as memórias do Brasil com a Dalva, as memórias do mar com o Etienne, as memórias do México com a Elvia e a Claudia, e as memórias de Portugal com o Vasco, o Rodrigo e o André;

  • Paris.


  • Claro que também há coisas de que não vou ter saudades, mas essas já as esqueci.

    Jorge Moniz às 15:27 |



    Ao Génio da Lâmpada
    Algo que misturasse a engenharia com a música, com a fotografia e com a escrita, seria simpático. Uma forma de fazer o que se gosta é transformar os passatempos em empregos.

    Jorge Moniz às 13:52 |





    Sei que o fotógrafo se chama Konrad Jacek Jedrzejczak e que é polaco. Não sei mais nada.
    (sei que esta imagem é fabulosa)

    Jorge Moniz às 10:45 |



    Poesia
    Sem tirares os olhos de mim, abriste um sorriso malandro e soltaste: "reparaste que as molas da cama rimam connosco?"

    Jorge Moniz às 09:39 |




    Morreu aqui neste fim-de-semana um rapaz de 14 anos durante um jogo de futebol amador. A informação foi dada na página desportiva dos telejornais, lá pelas 20:30, não houve ligação em directo a lado nenhum e durou menos de 2 minutos.

    Jorge Moniz às 07:04 |




    É então aprovada hoje no parlamento francês a famosa lei que proíbe os "sinais religiosos ostensivos" na escolas públicas. Que não se pense que a maioria dos franceses também acham isto ridículo: numa sondagem ficou-se a saber que 57 % pensam que véus, kippas e cruzes são uma "ameaça séria à coesão nacional". A mim esta lei já teve o efeito de cada vez que vejo uma mulher com um véu na rua me pôr a pensar se é o pai ou o marido que a obriga, se é uma perigosa fanática, se sofreu uma lavagem cerebral por uma organização clandestina... E antes eu não pensava.

    Jorge Moniz às 07:04 |



    segunda-feira, fevereiro 09, 2004


    Oásis
    Neve Shalom é uma expressão hebraica que quer dizer Oásis de Paz. Wahat al-Salam é uma expressão árabe que quer dizer Oásis de Paz. Ambas são a mesma aldeia em Israel, fundada conjuntamente por judeus e por árabes palestinianos de nacionalidade israelita. Nesta aldeia promove-se a educação para a paz, a igualdade e a compreensão entre os dois povos, prestando-se também assistência humanitária. É habitada deste 1977 e contam-se nesta altura 45 famílias. Numa delas a mulher é judia e o homem é muçulmano. Têm 3 filhas. Sigam qualquer um dos links - são (somos) todos iguais.

    Jorge Moniz às 12:08 |




    É um facto que andam muitos espanhóis a comprar terrenos na zona do Alqueva, na maioria dos casos para olivais intensivos. Os alentejanos, na maioria, dizem que preferem esperar para ver, porque não têm a experiência do regadio, etc... Ou seja, tanto tempo a pedir água para agora venderem os terrenos porque não querem aprender a trabalhar com ela. A preferência habitual pelo dinheiro imediato em vez do investimento.
    Isto é a reflexão típica de português a lamentar-se dos seus. Na realidade, apenas 5 % dos terrenos disponíveis naquela zona foram comprados por espanhóis. E há outras histórias, como a que ouvi ontem de um calceteiro de Moura que comprou barco e rede e aprendeu a pescar ao fim-de-semana na barragem. Diz que neste lado há mais peixe do que naquele, sem nenhuma razão em especial, e pesca sobretudo lúcio, que aparece em grande abundância. Os espanhóis, esses, parece que vêm mais pelo lagostim. Entretanto até uma gaivota solitária já por lá anda.

    Jorge Moniz às 11:55 |



    Prémio talk show do fim-de-semana
    Ardisson entrevista Véronique Jannot:
    - Tu préfères un mec qui baise bien mais qui est infidèle, ou un mec que baise mal mais qui est fidèle?
    - Qui baise bien et qui est infidèle. Parce que je pars du principe qu'il vaut mieux être à plusieurs sur la bonne affaire que toute seule sur la mauvaise. Il y a un truc terrible, c'est les hommes qui brandissent l'étendard de la fidélité et qui en fait vous ennuient sous le prétexte qu'il sont fidèles.

    Jorge Moniz às 09:38 |



    Prémio pub do fim-de-semana
    Anda aqui um anúncio na televisão a mostrar uma nova brilhante invenção que vai funcionar nas auto-estradas e permite uma ligação à conta bancária do automobilista, não precisando este de parar nas portagens.
    Com o atraso do costume que nós temos, esta coisa só deverá chegar a Portugal daqui a uns bons anos. Mas eu proponho desde já que se venha a chamar... hummm... Via Verde. Acho que é um bom nome.

    Jorge Moniz às 09:38 |



    Prémio de humor do fim-de-semana
    Demonstração do funcionamento do pêndulo de Foucault no Musée des Arts et Métiers. Diz o guia:
    - A pergunta pode parecer um pouco disparatada, mas às vezes as pessoas chegam aqui sem essa informação, por isso: vocês sabem para que serve o pêndulo de Foucault?
    Após alguns segundos de silêncio e sorrisos tímidos, um distinto senhor grisalho de fato e gravata levanta a voz e dá a resposta esperada:
    - Encontrar água.

    Jorge Moniz às 09:37 |



    sábado, fevereiro 07, 2004


    A propósito de há algum tempo ter tido uma conversa do género que já não tinha há muito tempo (lembram-se?):
    Há determinadas coisas que só se dizem a partir de certas horas da noite e após muito tempo de convívio recente. De um momento para o outro, os temas normais esgotam-se e, sem mais razões aparentes, as palavras tomam outro caminho, passando-se barreiras uma hora antes intransponíveis. Hummm... eu diria que o cansaço e o sono também devem ter um papel nisto.

    Jorge Moniz às 16:21 |



    Quem sabe...

    in the hour of the girl
    you can make this danger witness
    or whatever, without your heart
    so you wish you could relate
    if it's always gonna be
    sit beside me on a star
    if you wake me up tonight


    kurt wagner

    Jorge Moniz às 16:19 |



    sexta-feira, fevereiro 06, 2004





    Está vento lá fora. Vejo-o por entre os ramos despidos das árvores de Janeiro. Está frio também, mas será menos do que aquele que eu sinto. Quando há pouco aqui estiveste, todo eu era as minhas mãos a tremerem. E o meu frio era saber que ias sair do quarto, que não te ia voltar a ver e querer guardar com força o teu rosto no meu olhar. O teu rosto e todos os teus rostos e todos os outros rostos que eu fixei. Porque o rosto tem o mistério de ser ao mesmo tempo o lugar mais exposto e mais íntimo do nosso corpo. É pela face que reconhecemos alguém e é na face que procuramos os indícios, certos ou errados, voluntários ou irreprimíveis, do que esse alguém pensa e sente. Somos icebergs de que as pontas visíveis são os nossos rostos.

    Nesta manhã passou a vida inteira. Estive em Livorno com os meus pais e os meus irmãos. Sofri de uma pleuresia e de uma febre tifóide. Desisti da escola e aprendi a pintar. Fiz com a minha mãe uma viagem pelos museus de Florença e Roma. Fui a Inglaterra e vim para Paris. Esculpi enquanto pude e expus o que pintei. Tive uma exposição proibida por atentado ao pudor. Esta manhã bebi todos os dias a moeda que recebia por reles retratos de ocasião. Conheci o Pablo, o Henri e o Sebastien. Conheci também o Hector e queria falar das casas que ele faz mas já não tenho tempo. E conheci o Emmanuel, que faz banda desenhada muda assinando Caran d'Ache, que é igual a Karandach, que é "lápis" em russo, mas também já não tenho tempo de falar dele. E depois conheci-te a ti e fui pai. Nesta manhã passou a vida inteira. E é como se em toda ela estivéssemos nós os três.

    O meu nome é Amedeu e estou sozinho neste quarto. Penso ainda umas linhas. Pergunto-me, por exemplo, se fui feliz. Tive uma vida curta, é certo, mas preenchida. Não é isto preferível a viver uma vida em branco, longa de penitências, para se ser feliz apenas enquanto velho, quando já pouco se pode aproveitar? A doença, as doenças acompanharam-me todos estes anos e quando não estava afogado em dores, estava imerso em álcool, mas posso-me responder que sim, que fui feliz. Uma felicidade triste. A felicidade é isso, a felicidade é um anjo com o rosto grave.

    ---

    Amedeo Modigliani morreu de tuberculose a 24 de Janeiro de 1920 com 35 anos de idade. No dia seguinte, a sua esposa grávida de 6 meses atirou-se do quinto andar onde moravam os seus pais.

    Jorge Moniz às 11:54 |



    quinta-feira, fevereiro 05, 2004





    Na altura nunca soubémos porque tinhas vindo de Londres para Paris. Não gostavas de falar disso, querias passar despercebido. Fechado no teu quarto, escrevias e escrevias e repetias que o objectivo da arte é revelar-se a si própria e ocultar o artista. Mas rapidamente a tua excentricidade foi mais forte e começou a falar-se em surdina de um tal Sebastien, escritor de cabelos compridos que enche o quarto, imagine-se, de girassóis e penas de pavão. A origem da inconfidência estava, claro, na porteira portuguesa do teu prédio. Não viveste o tempo suficiente para sofrer com a inconveniência.

    Entre nós, muitas vezes falámos do acto criativo, seja da arte escrita, como era o teu caso, da arte plástica, como era o meu, ou mesmo da arte musical. Concordávamos na existência de duas fases necessárias à criação. Uma de vivências, de assimilação de experiências; e outra de isolamento, em que se processa, mais ou menos conscientemente, o vivido, para então o exprimir de algum modo.
    Os ritmos é que podem ser muito diferentes. Há escritores e compositores que se isolam durante meses para produzir uma obra e depois estão outro tanto tempo aparentemente sem fazer nada. Outros hão com ciclos mais curtos. Diários mesmo. Como os pintores que à noite se divertem com as mulheres que de dia pintam.
    Ou daqui a umas décadas, talvez inventem umas máquinas chamadas computadores e talvez inventem uma rede a ligá-los todos - e na tua língua vão chamá-la internet - e depois talvez inventem uns diários de bordo publicados nessa rede - e na tua língua vão chamá-los weblogs, ou blogs para ser mais curta a curta palavra. E haverá autores desses diários de bordo que têm a sua profissão convencional, o seu copo com os amigos, a sua ida ao cinema e depois, sós no silêncio da noite, abraçam uma caneta, um lápis, uma pena, ou simplesmente batem num teclado.
    Mas o que se mantém em todos os casos é a necessidade de beber experiências para depois as transmitir. Sem isso não sai nada. Memórias nostálgicas, se tanto.

    Entre nós, não falávamos de mulheres. Nunca liguei muita importância ao facto enquanto foste vivo: há inúmeras razões para se estar sozinho, voluntariamente ou não. Depois da meningite te levar, vieram os rumores, os boatos. Foi mais uma vez a porteira portuguesa do teu prédio, que contou à porteira portuguesa do meu prédio, que contou à estudante francesa, que agora ajeita a almofada ao pintor italiano e que lhe contou os rumores, os boatos. Diziam que o teu verdadeiro nome não era Sebastien, era Oscar. Diziam que eras casado e pai de dois filhos. Diziam que tinhas passado dois anos preso por um caso de sodomia. E diziam muitas mais coisas de que me esqueci ou de que me quero esquecer. Percebi então com outro alcance o teu lema de que o melhor meio de resistir à tentação é ceder-lhe.

    Que posso eu dizer agora? Que não me interessa qual era o teu verdadeiro nome. Que isso não diz nada do passado agora, quando muito do futuro quando foi escolhido. Como a história da Violeta que, daqui a uns anos, abrirá aqui na Rua Mouffetard uma loja de flores e cá vai ficar pelo menos quatro décadas, oferecendo a passantes frequentes e ocasionais o seu sorriso de florista. E para mais ela será ruiva, o que irá muito bem com as flores em geral, as violetas entre elas (já histórias diferentes poderão contar as Rosas e as Margaridas). Mas tu deixaste-nos o que escreveste e isso é independente do teu nome, afinal, qual é a importância de se chamar Sebastien, Oscar, ou mesmo Ernesto?

    Jorge Moniz às 06:37 |



    quarta-feira, fevereiro 04, 2004





    Todas as noites olhavas as mesmas pás vermelhas do mesmo moinho, entravas no mesmo cabaret, subias para a mesma cadeira, junto à mesma mesa, ajeitavas o mesmo chapéu, afagavas a mesma barba, pedias o mesmo cognac, o mesmo absinto e desenhavas as bailarinas, que nem sempre eram as mesmas, mas que dali a alguns dias estariam em cartazes a anunciar os espectáculos desse mesmo cabaret. Os tipógrafos levavam as mãos à cabeça, que loucura é esta, que cores são estas impossíveis de imprimir. Ao que respondias: eu misturei tintas, o senhor só tem que misturar pigmentos.

    Sempre me fascinou a tua maneira de pintar e desenhar. Não tanto nos tais cartazes encomendados, mas em telas mais pessoais. Às cenas de superficialidade dos cabarets, prefiro as cenas que nasciam da tua melancolia interior: a criação raramente é produto das horas felizes. Eram cenas de que fui copiando as cores, o traço do desenho, os contornos dos rostos. Mas ao imitar conscientemente as qualidades, acaba-se também por seguir os defeitos, faz o que eu digo, não faças o que eu faço. A tua torturada personalidade e os teus complexos transformaram-se na minha inveja. A indizível inveja entre amigos, Henri, que é a que rói mais fundo e mais corrompe, porque nunca assumida. Com o passar do tempo, fui estudando e aperfeiçoando-me e acabei por criar um estilo que penso ser meu, sendo que nunca inventamos nada de completamente novo, antes fazemos combinações originais do que já existe.

    Era sentado naquela cadeira, àquela mesa, naquele cabaret, que te sentias mais igual aos outros. Os outros que assim não podiam ver a tua verdadeira estatura, o tamanho das tuas pernas. Era-te difícil tentar explicar a todas as pessoas que as tinhas partido em criança, uma de cada vez, e que uma deficiência de cálcio as impediu de crescer. Era-te difícil discutir olhos nos olhos quando estavas de pé. Era-te difícil tornares-te atraente para as mulheres. Era-te difícil não beber para esquecer. Era-te difícil depois não pagar a uma rapariga do passeio ou de um bordel. E foi-te enfim difícil admiti-lo, quando te apaixonaste por uma delas. E por causa dessa visão da vida tristemente distorcida, viste piedade onde havia amor. Por cobardia, por não acreditares que podias ser amado, ficaste a mastigar o que sentias e não o assumiste. E ela acabou por partir. Então tu abriste todas as torneiras de gás dos candeeiros de tua casa e não os acendeste. Depois arrependeste-te e, com a mesma lentidão, fechaste as mesmas torneiras e abriste as janelas. A dor, essa, continuava lá. E o insuportável, o insustentável, não é a dor, é a facilidade com que se lhe sobrevive, com que ela se torna leve: insustentável é a leveza do ser.

    Apesar de já teres uma idade respeitável, vem a tua mãe e o louco do teu pai e levam-te de volta para Toulouse, onde o que tinha de acontecer aconteceu. Sim, eu sei que não foi pelas tuas mãos, foi doença súbita, mas a vontade conta muito nestas coisas.

    Jorge Moniz às 09:07 |



    terça-feira, fevereiro 03, 2004





    Foste tu que nos apresentaste, Pablo. Na altura pensaste que era só mais uma. Mais uma estudante da Academia que um de nós iria conhecer melhor do que o outro. Certo, eu não era propriamente casto com as mulheres, mas a tua volatilidade ficava muito longe da minha vontade.

    Tratei-te agora por Pablo, mas entre nós eras mais conhecido como "o génio". Eu que sou bastante comedido com os elogios, hesito claro neste qualificativo, mas reconheço-te algo característico de todos os génios: surpreendes-me com isto que adoro e aquilo que detesto, invertendo-se as opiniões ao trocarmos de observador.
    Por vezes divertes-te a recortar pedaços de papel colorido ou de jornais e a colá-los. É diferente, concedo, mas nem sempre gosto do resultado. Prefiro de longe quando toureias uma tela de pincel em riste. Vejo-te como um matador. Vais à frente, deixas um traço, uma razia, vens atrás, olhas, vês o resultado e de novo investes. Vejo-te em bicos de pés. Avançando e recuando em pequenos saltos, largos gestos e um olhar louco. Vejo-te essa madeixa inquieta, ironicamente parecida com a de um frustrado pintor alemão, que combateu discreto nesta guerra e que, como a discrição não lhe vai muito, talvez venha a causar uma outra. E tu talvez ainda venhas a pintar o que os seus aviões irão fazer nalguma cidade do teu país.
    A tua loucura, essa, não passa de ataques passageiros de mau-génio e é invariavelmente aliviada nas tuas mulheres. Que ainda assim te continuam, continuarão a amar. E imagina tu que daqui a um século, nas mesmas terras civilizadas em que nascemos, cenas destas continuarão a repetir-se e maridos pedirão o mesmo perdão que tu pedes e mulheres darão o mesmo perdão que te é dado, porque desta vez vai ser diferente, juro, e se te bato é porque te amo.

    Vejo-te como um prisma que é capaz de separar esses momentos de dor e amor em cores, frios azuis nuns casos, quentes rosas noutros e são estes enfim que eu prefiro, sim.

    Tu apresentaste-nos e eu soube. Cá dentro. Durante dias tentei desenhá-la de memória, sem sucesso. O riso dos seus olhos, o brilho dos seus lábios, para isso não havia pigmentos, não havia técnicas. A sedução deve vir antes da paixão, senão esta atrapalha aquela, e eu apressei-me então a voltar a encontrá-la e convidá-la para ir conhecer o atelier. O que dissemos, fizemos, sentimos ficou só para nós. Cá dentro.

    (Ela pega no trapo ensopado de água morna que caiu ao chão. Torce-o para uma bacia. Encharca-o de novo em água fresca. Deixa pingar o excesso. E volta a deixá-lo na minha testa.)

    Eu soube e sabia que ia ser diferente e tu achaste e achavas que tudo iria ser igual. Expliquei-te que para mim a fidelidade não é ao compromisso, é aos sentimentos. Não é ter uma relação com uma mulher que me faz desviar o olhar de outras; é amar uma mulher, mesmo que nem a conheça. Depois quiseste ser protector e falaste-me da cegueira, da fragilidade do coup de foudre e de novo estavas enganado, pois isso não é importante: podia bem ter sido algo amadurecido. Todos temos a fantasia do amor ao primeiro olhar, ao primeiro gesto, às primeiras palavras, mas ele não é menos genuíno se for crescendo ao longo do tempo. Não interessa o caminho. Ao ser assumido e consumado, é irrelevante se nos conhecemos ontem ou há dez anos. Nesse instante tudo é novo e tudo é maior que tudo. Todo o mundo ao longo do tempo já atravessou todos os sentimentos que nós ainda não conhecemos. Mas quando os sentimos, somos os primeiros.

    Jorge Moniz às 09:39 |



    segunda-feira, fevereiro 02, 2004





    O meu nome é Amedeu. Não é um belo nome, bem sei, mas em Itália, de onde eu venho, até não soa mal.
    Não sei porque comecei por me apresentar com o meu nome. É o que toda a gente faz, mas o nome não diz nada de si. Se eu me chamasse Francesco ou Giuseppe era a mesma pessoa. Acho. Há quem tente associar o nome de alguém à sua personalidade. Eu admito que possa haver alguma relação, porque os pais que escolhem o nome do filho são os mesmos que o educam. Há pelo menos a questão estética da escolha.

    Podíamos apresentarmo-nos pela nossa profissão: "Bom dia, sou carpinteiro." Sempre era mais esclarecedor. Tirando os casos das pessoas que não escolhem a sua profissão, em que aí talvez ficássemos a saber mais sobre os seus pais do que sobre elas próprias.

    De qualquer maneira, começar pela profissão não me ajuda nada, porque eu ainda não tenho profissão. Nem sei bem o que quero fazer. Sei que gosto de pintar. E é só. Os meus irmãos escolheram cedo as suas profissões: o mais velho é advogado e o outro é engenheiro. Os dois foram excelentes alunos ao contrário de mim, que abandonei o liceu em Itália e vim para Paris um pouco à aventura...
    (É verdade, tenho 16 anos - não sei se é um dado relevante.)
    A minha irmã ficou a fazer companhia à mãe e à avó lá em casa; o pai passa muito tempo a tratar dos negócios de carvão na Sardenha. Quando o meu irmão começou a trabalhar lá com ele, eu algumas vezes também apanhava o barco. Ele enjoava um bocado, mas eu gostava do passeio, gostava de ver os tons de azul do Mediterrâneo mudarem com a ondulação do mar ou com a posição do Sol.

    Quando cá cheguei, fiquei num hotel lá em baixo e inscrevi-me em algumas aulas de desenho. Passadas umas semanas decidi vir para a colina, A Colina. Ou outeiro, como eles lhe chamam aqui. Butte, em francês, que soa igual a but, objectivo, fim, termo, golo, alvo. A colina é tudo isso. E ainda refúgio, boémia, aldeia, íntima, secreta.


    ---

    E não há mais nada. Foi a única página que escrevi na minha tentativa de diário de juventude. Felizmente! Ridícula aquela sucessão de significados armada em literatura! A escrita não é de todo o meu forte, nunca foi, mas voltar a ler isto, agora que pouco mais posso fazer preso na cama, teve o mérito de me fazer lembrar deles.
    Foi nessa colina de Montmartre que, entre um cigarro e um copo, conheci o Pablo, o Henri, o Sebastien e tantos outros. Ou, como eu teria dito então, um pintor, um desenhador, um escritor e outros tantos. Hoje naturalmente sei que se um homem não é o seu nome, também não é a sua profissão. Nós, aqueles homens, entre um copo e um cigarro, falávamos da vida, das artes, da política e das mulheres, claro. As que pintávamos, desenhávamos, descrevíamos e as outras. As que amávamos. Quando não eram as mesmas.



    Jorge Moniz às 12:02 |



    domingo, fevereiro 01, 2004


    1
    Hoje que isto faz um ano, fui sacudir o pó aos arquivos e ver o que se escreveu por aqui nos primeiros dias (para quem não sabe, na altura ainda éramos vários a fazê-lo e quase na forma de chat...).
    Pelo caminho isto mudou de nome e de aspecto gráfico umas quantas vezes. Hoje gosto como está, mas não sei o que direi amanhã.
    Pelo caminho fui alargando o tipo de coisas que aqui deixo. Num dia uma linha, no outro trinta e no outro nenhuma. Num dia cito, no outro invento e no outro penso.
    Pelo caminho fui perdendo alguns leitores que conheço, conhecendo alguns que ganhei e ganhando alguns que não conheço. É assim, sem juízos.
    E agora chega de olhar para trás, venha o resto, seja lá o que for.

    Jorge Moniz às 10:54 |



    Uma encomenda

    Put your hair back, we get to leave
    Eleven gallows on your sleeve
    Shallow figure, winner's paid
    Eleven shadows way out of place
    Standing too soon, shoulders high in the room

    Pull your dress on and stay real close
    Who might leave you where I left off?
    A perfect circle of acquaintances and friends
    Drink another, coin a phrase
    Heaven assumed, shoulders high in the room

    Try to win and suit your needs
    Speak out sometimes but try to win
    Standing too soon, shoulders high in the room


    R.E.M.

    Jorge Moniz às 10:54 |



    La douceur
    Ontem durante toda a tarde fui um homem fechado num quarto a escrever, nunca sequer olhei para a janela. Por isso, quando de noite saí à rua, estranhei a chegada de um vento forte e ameno.
    E estranhei passar por uma loja com luzes de Natal a piscar. Pensei que já era tarde para os donos ainda não terem vindo de férias.
    E estranhei descobrir grandes écrãs a transmitirem a TV5 na estação de metro Europe. Não passo lá todos os dias, mas ultimamente tem acontecido e pelos vistos nunca tinha olhado para o cais.
    E estranhei estar a ouvir o CD da Aimee Mann e minutos depois vê-la a cantar numa qualquer série juvenil na televisão.
    E estranhei ver o dono do bar aqui da esquina dizer a três polícias: "Ele não deve estar longe."

    Hoje está um belo dia de sol morno. Na língua local diz-se la douceur.

    Vou abrir as portadas e as janelas e pôr-me a andar.

    Jorge Moniz às 10:53 |