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sábado, abril 24, 2004
A história desta foto da cadeira (ou do pescador desaparecido)
A data eu podia dizê-la, mas tinha de ir vasculhar em agendas antigas ou nas costas da fotografia e não me apetece. Digamos apenas que foi nos dias seguintes ao referendo em Timor-Leste. Enquanto em Portugal toda a gente se manifestava, eu olhava para o Adriático.
Na véspera daquela manhã decidi acordar cedo. Porque nunca tinha visto um nascer-do-sol no mar. A maré estava baixa, como sempre naquela costa – andam-se dezenas de metros mar adentro com a água pelos joelhos. E a bandeira está sempre vermelha. Perguntei ao recepcionista do hotel porquê, ele encolheu os ombros e disse qualquer coisa de correntes... Para mim é mais porque quase todos os veraneantes são idosos.
Quando cheguei à praia ela ainda estava fechada. Literalmente. Numa extensão de quilómetros toda a praia está concessionada e repleta de chapéus-de-sol, espreguiçadeiras e vestiários permanentes, como que congelados nos anos 20. Por isso há portões que se fecham à noite – a praia tem mesmo horário de funcionamento.
Existe no entanto um pedaço de areia livre, junto ao pontão que delimita a entrada para a marina de Rimini, a cidade de Fellini (e agora de Pantani, também).
Enquanto andei para trás e para a frente neste pontão não vi ninguém. O Sol nasceu, tirei fotografias, vi pedaços de limão abandonados e esta cadeira. Imagino que pertencesse a um pescador, pela sua posição e pelo padrão da camisa. Mas não havia vestígios nem de pescador nem de cana. Por que teria ele saído sem levar pelo menos a camisa? Teria levado a cana ou nem sequer a tinha trazido? Ou nem sequer era pescador? Há quanto tempo estaria abandonada aquela cadeira ali? E todas estas perguntas mais não fazem do que adiar a pergunta mais importante: quando ele se levantou da cadeira, terá apenas dado dois passos em frente?
Jorge Moniz às 14:07 |
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