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sexta-feira, junho 18, 2004
O meu irmão é que tinha razão. Ou se calhar não... não sei... Eu já não sei nada desta vida... Ele aproveitou os tostões que o nosso pai poupou e seguiu estudos. É bancário e esses tipos safam-se bem, ficam com boas reformas. Eu, como achava que não era inteligente, usei a minha parte do dinheiro para abrir uma taberna ali ao pé da Igreja de S. Domingos. Sim, era ao lado da Ginjinha... Fechei há quatro anos e sete meses, bem contadinhos... O médico da caixa disse-me que com a minha saúde eu não podia ficar ali todas as noites de pé até às tantas. E de qualquer maneira, o negócio tava muito mau, muito mau. Agora as pessoas já só comem desses hamburguers e bebem coca-colas... Os velhos que ainda ligam à bifana e ao copo de 3 já morreram quase todos...
Fica-se com uma reforma de miséria, é o que é... Às vezes o meu irmão empresta-me dinheiro quando vem cá e eu passo umas noites numa pensão da Almirante Reis. Tirando isso vou ficando com os meus caixotes de cartão à entrada de Sta. Apolónia. Depois dou umas voltas por aí, que não gosto de estar parado o dia todo. E vou vendo as pessoas a passarem.
Gosto de vir aqui para estas arcadas. Ajeito o boné na cabeça e vou olhando à esquerda à direita. Do lado de lá vejo muitos políticos, daqueles da televisão, ministros e isso. E as pessoas que vão e vêm dos barcos. Deste lado é mais calmo. Agora está aqui esta coisa do turismo com um nome em estrangeiro, uélcome qualquer coisa, e vejo muitos cámones e espanhóis... é assim... Vou vendo as pessoas a passarem... E reparo nas coisinhas de cada uma. Aquela senhora de saia branca, por exemplos, levava um saco da Pollux com uns novelos de lã e ali à entrada está um turista a tirar fotografias. Ou se calhar não é turista, que isto há muita gente que mora cá e gosta desta cidade. Ele realmente não tem cara de estrangeiro...
Jorge Moniz às 23:10 |
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