(mordidas mansas)














(por vezes bravas)



morder
 
os legumes
e o cacau,
à beira-mar,
em dias
e dias
de enganos;
afundando
ao vento
cogumelos
duns e doutros;
sem nada
de nada
ao colo
e recortando
fotos
de cães.

sacudindo
dias
de conversas
no camarote.

comendo
causas,
políticas
e erros
de um lado
e do outro;
fixando
de repente
o que tem
a praia:
letras
e girafas.



morder
o mundo

 
todos os minutos
todas as horas
todas as semanas
em francês
e em inglês



morder
os sons

 
em 5 minutos
debaixo de água
conhecendo
lendo
sentindo
e comprando



morder
as imagens

 
pessoais
amadoras
profissionais
em movimento
brevemente
aqui



morder
as palavras

 
sentidas
no escuro
em busca
de tempo



morder
o passado

 
<< hoje



e-mail

This page is powered by Blogger.

Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com















sexta-feira, fevereiro 23, 2007


Pão quente
Ela tem a idade do meu pai, mas parece ter mais 20 anos. Desde que me lembro que me parece velha e acabada. É a vida que faz a cara das pessoas e ela teve pouca sorte: marido alcoólico e violento, filhos ingratos, pobreza generalizada. Em tempos idos chegou a fazer limpezas em nossa casa e na escola da minha mãe. Uma das filhas foi a minha ama. Nunca me esqueço da fotografia que temos os dois sentados num barco de pescadores e do raspanete que a minha mãe lhe deu quando a apanhou a namorar debruçada no muro em vez de estar a tomar conta de mim.
A senhora sua mãe é daquela espécie rara de pessoas que são extremamente religiosas e cumprem o que ouvem na igreja em termos de uma absoluta falta de maldade, fazer o bem sem olhar a quem, dar a outra face, em suma tudo o que na sociedade hoje em dia se chama ser otário. Pelos trabalhos que a minha mãe lhe foi arranjando a ela e à filha, pelas nossas roupas em segunda mão que lhes são oferecidas e o mais que houver, ela demonstra sempre uma eterna gratidão, nunca se esquecendo de uma data de aniversário da nossa família. Mas muito melhor do que qualquer presente que ela possa dar, é o pão que coze no forno. Faz sempre um a contar connosco e trá-lo embrulhado num pano para conservar o calor. Quando eu e a minha irmã estamos, mesmo que tenhamos acabado de almoçar ou jantar, corremos a buscar a faca, a lutar para ver quem fica com a "maminha" e regalamo-nos com a manteiga a derreter naquele pão ainda bem quente.
Quando penso na idade da senhora, lembro-me que provavelmente nenhum dos filhos aprendeu a cozer o pão daquela maneira e que ninguém o continuará. E lembro-me que, tal como a minha avó, ela diz sempre o meu nome com um "z" no lugar do "g".

Jorge Moniz às 20:12 |